2006-09-24

NOTA DE ABERTURA





COMBINAÇÕES
MISTERIOSAS



Quis o acaso que fosse eu a dar o pontapé de saída no Pau.
Se o tema geral da minha colaboração tinha sido objecto de acordo prévio, caber-me-ia escolher a forma como o apresentaria e os ângulos em que o poderia tratar.
Muitas vezes, assumem-se participações deste género em função de materiais existentes e que de algum modo gostaríamos de ver divulgados. Outras, até pela própria natureza das realizações em apreço, pressupõem a produção de novos trabalhos e, em conformidade, os autores, à medida das regras da periodicidade dada, vão elaborando as peças com mais ou menos unidade entre si, ou, em alternativa, escolhe-se escrever uma série de inéditos que depois se fazem sair da maneira mais conveniente.
É claro que do ponto de vista do leitor, em qualquer daquelas situações esperar-se-à a novidade, isto é, na melhor das hipóteses, algo que acrescente valor ao que possa haver a respeito do assunto considerado, na mais fraca daquelas possibilidades, ainda que repetindo com o toque de alguma originalidade.
Possuindo textos sobre o racismo que sempre permaneceram no silêncio do manuscrito, embora façam parte do conjunto de dados que sobre esta temática tenho produzido e ao mais variados níveis e diversos âmbitos tenho vindo, em parte, a publicar desde há uma década, poderia muito bem ter escolhido começar com a mais-valia de matéria virgem. Contudo e sem a menor desconsideração e muito menos desrespeito por quem possa atentar nestas minhas palavras, optei por lhes proporcionar a repetição de pequenas notas que escrevi em Dezembro de noventa e nove e que fizeram parte de uma pequena brincadeira digital a que, em companhia com o responsável pela ideia e co-executante da mesma, o Luís Carlos Rodrigues dos Santos, amigo de sempre, demos o nome de “O Largo da Graça”.
Honestamente não sei definir no que consistiu aquela praça. Editamos dez números de uma pequeníssima reunião de textos em duas páginas apresentadas na horizontal e divididas ao meio que enviávamos por correio electrónico para umas mãos cheias de amigos, quinzenalmente, mais ou menos à mesma hora da noite da sexta-feira respectiva e a que a partir da abertura passamos a juntar os comentários que aqueles e outros nos faziam chegar. Sem explicações, sem apresentações, durante seis meses demos corpo a uma série que se despediu pelo conteúdo das componentes do último fascículo. Para lá das loas inevitáveis nestes cumprimentos de quem se conhece e reciprocamente se estima, houve quem lhe chamasse jornal electrónico, manifesto exagero mas não de todo inadequado se quisermos alargar aquela noção ao conteúdo de uma revista que seria o produto com que aquilo que fizemos mais se poderia parecer, salvaguardado que está o pomposo do termo para designar aquilo que de facto se fez. Mas não andaremos longe da verdade e do bom senso se escrevermos que o “O Largo da Graça” se tratou de uma folhinha electrónica que por motivos que pouco importam aqui averiguar, o Luís Carlos e eu decidimos pôr em prática nos primeiros seis meses do ano dois mil.
Quase que poderemos dizer que foi algo parecido com um blog antes de tempo, pois, pese embora toda a minha ignorância nesta área do saber tecnológico, tanto quanto me parece ainda a blogosfera não existia ou, pelo menos, seria frequentada por uma minoria de, salvo seja a expressão, iniciados. E por isso a recuperação do nome para o espaço de debate no “Atirei o Pau ao Gato”. Ora em parte também por isso a preferência por dar uma segunda oportunidade às anotações que então dei a conhecer.
Mas para lá da homenagem a uma antecipação formal, precisamente pelo apontado denominador comum dos destinatários e pelos laços entre os executantes, esta ousadia de uma repetição parte justamente do propósito de também assim homenagearmos a amizade que é uma das riquezas que podemos encontrar na vida e, afinal, sempre será um preventivo de pensamentos e atitudes racistas pois quando somos capazes de deixar que ela brote para com indivíduos diversos da população a que pertencemos, facilmente compreendemos que o racismo, enquanto construção teórica e ideológica que é, só pode tratar-se de uma falácia.
É pois como uma homenagem a um amigo de infância, com quem partilhei brincadeiras e as cumplicidades de quem se vê crescer em comunhão de aventuras e ainda hoje partilho, entre outras, coisas como este ponto de encontro on-line, é nessa dimensão de louvor e brinde que aqui lhes apresentarei aquilo que no ano dois mil publiquei sobre a relação entre o conceito de Humanidade e a prevenção relativa aos preconceitos etnocêntricos. Isto, naturalmente, a partir do próximo post.
Tratando-se de uma reposição, igualmente mantive o título geral e a respectiva titulação que então atribui a cada um deles.
Bem hajam pela generosidade do tempo que perderem comigo.

Luís F. de A. Gomes
Alhos Vedros, 23 de Setembro de 2006